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    Brevíssima


    "Faz um tempo eu quis
    fazer uma canção
    pra você viver mais"
    Pato Fu - "Canção pra Você viver mais"

    Brevíssima


    E às vezes eu me surpreendo: como posso suportar a mim mesma por tanto tempo? É uma pergunta sem resposta, e isso me irrita profundamente.

    Viva, borboleta, viva da forma pueril e breve de sempre. Mostre-me tudo o que eu não conheço e, ainda assim, me lembro de conhecer. Aquela memória que vem, me assalta, me mata de saudades e depois diz: você não me viveu. E continua a me matar de saudade. E continua a me fazer lembrar de sóis e pessoas e lugares e sentimentos que não conheço. Que me faz arrancar minhas raízes e colocá-las ao vento, esperando que ele me leve para aquela lembrança que eu não tenho, mas que me mata. Que me mata e que me prende.

    Dejá vù, eles dizem. Saudade, digo eu.

    Devolva-me minha vida, minhas memórias (verdadeiras, que não me doem) e minhas meias de dormir, Borboleta. São pretas, quentinhas e macias, como algemas suaves nos meus pés. Tente enganar ao Diabo e aa Deus, mas não tente me enganar. Eu sofro da saudade que mata, e nada mais.

    O sol vai sumindo, as nuvens são têm uma textura colorida que desconheço, as árvores se acalantam e a saudade vem com o vento. E me prende em minhas meias, minhas raízes e na grade do meu quarto. O céu se divide em dois: o de ontem e o de depois, e a saudade que vem e invade dizendo "vós sois...?".

    Me invade, me indaga e me faz querer voar como você, Breve Borboleta. Para aquelas memórias que não tenho, para aquela vida que nunca vivi, para aquele mistério que corrói minha alma e envenena minha mente - minha realidade.

    Pois o que o vento trás consigo, Pueril Borboleta, é ilusão de terras que nunca vi, mas que me lembro e que consigo cheirar no ar, como o perfume de coisa alguma aa minha volta. E isso estraçalha minha realidade, esmaga minha alma e me mata de saudade. Onde está o pássaro que queria voar? Onde está a onça que é minha alma, que outrora num bote devorava a morte e a saudade? Onde está?

    Foi você que levou. Brevíssima Borboleta. Me deixou desarmada: sem pássaro, onça ou alma. Me deixou vazia, na minha mente - minha realidade -, e voou com tudo que era meu.

    Menos com minha saudade que mata. Que mata e corrói um corpo sem alma. Que não sente nada.
    Só essa maldita saudade, que me mata de saudade da saudade que não sinto mais.


    "And she says [...]
    'You?re six foot tall and east coast bred
    Some lonely night we can get together
    And I?m gonna tie your wrists with leather
    And drill a tiny hole into your head
    I'm gonna drill a tiny hole into your...' "
    Andrew Bird - "Fake Palindromes"

    26 de Dezembro de 2006.


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